domingo, 24 de abril de 2011

Desbravadores de territórios já desbravados

Por André Andrade



No século XVIII o filósofo Rousseau propalava que o primeiro homem que cercou um pedaço de terra e disse que era sua propriedade e encontrou pessoas que acreditaram nele foi o fundador da sociedade civil.” Não querendo entrar no mérito sobre a origem das desigualdades, assunto este que o pensador discute a partir desta colocação, aproveitaria a citação para se perguntar: e quando a cerca é imaginária, como faz?
Aqui no Sul da Bahia, ora ou outra mechem num assunto fétido que é a questão dos limites territoriais das principais cidades dessa região, Itabuna e Ilhéus. A fagulha da vez foi a chegada de empreendimentos que se estabeleceram na zona de conflito – onde se encontra o suposto limite entre as cidades. Todavia, tais limites não delimitam a tolerância dos chefes locais, e o que passamos a assistir é uma troca de farpas de ambos os lados preocupados em levarem para si o título de cidade em expansão, ou de forma eufemisticamente colocada, em desenvolvimento.
Ilhéus, capitania quando do período colonial, sobre a égide de ser a primogênita da região, chegou ao escrúpulo ( a partir da voz de seus representantes) de “desemancipar” a pródiga Itabuna, filha rebelde que desatou laços umbilicais com a Princesa do Sul e auto-outorgando o título real de Rainha, ousadia esta advinda do fruto de ouro, muito próspero nestas terras férteis livre da maresia corrosiva do mar.
A cutucada do tigre fez o Leão rugir alto e de forma estridente. A resposta veio de um deputado que faz parte de uma comissão estadual que trata de assuntos territoriais, detalhe que deixou as autoridades ilheenses em estado de preocupação. O respectivo deputado chamou a atenção para o abandono do bairro Salobrinho, pertencente à Ilhéus, anunciando claramente as intenções de estender o domínio itabunense até o destratado bairro, e porque não a Universidade estadual de Santa Cruz, real motivo que induziu o deputado a proferir tais palavras? O que dá tal ousadia a este deputado de anunciar essas pretensiosas mudanças é o status da cidade de Itabuna que atrai toda a população das cidades circunvizinhas devido ao “turismo” comercial, o que a torna imponente ante às suas vizinhas.
O grande imbróglio é que os interesses políticos, aliados aos interesses econômicos atiçam uma rivalidade local que não traz vantagens para nenhum dos lados, e muito menos pra quem fica na berlinda, o povão. Desde o declínio da produção do fruto de ouro, a região vive à deriva, sem rumo. Assiste-se apenas o tempo passar, intercalados com algumas trocas de farpas entre os notáveis. O que se vê é uma classe média, de mão de obra qualificada, aproveitar a rentabilidade econômica provinda dos assalariados engordarem suas contas. Assalariados custeados por empresas, cujas disputas políticas as fazem se sentirem como se estivesse cedendo um favor aos miseráveis grapiúnas.
A mudança dos limites não vai mudar EM NADA a situação da população local de baixo estudo: trabalhando em regime de exploração, ganhando salário minimíssimo, compondo famílias sem condições de dedicarem-se à educação de seus filhos, ou seja, são disposições estruturais que enrijecem a linearidade de vidas que irão somente “passar”. Enquanto que os nativos trocam tapinhas, os estrangeiros, bem acomodados no meio do fogo cruzado, lucram sem reverteram nada para beneficiar o nosso espaço. Caso pensem em alguma ação do tipo, provavelmente será o financiamento de um muro da discórdia porque com toda essa abstração, essas discussões não passam de uma piada lamentável.

sábado, 9 de abril de 2011

Ainda Bourdieu Vs Marx

Por Humberto Rodrigo

  De certa uma forma dando continuidade ao meu último texto  (http://panoptico-social.blogspot.com/2011/03/consciencia-de-classe-que-classe.html ) e ainda digerindo, em doses homeopáticas, a leitura de Bourdieu (O Poder Simbólico), me volto novamente à questão do poder e das lutas de classe. Só que desta vez não com o intento de discutir se é possível ou não uma luta unificada - de fato e de direito - das classes menos favorecidas ante as elites. Desta vez o intuito é analisar a relação de uma classe qualquer (seja ela a dos operários, das domésticas, dos jogadores de xadrez da esquina,...) com o líder sindicalista e o poder.
   Em "A Ideologia Alemã" Marx assinalou que todas as classes aspiram ao poder. Eu discordo do "velho" Marx, acho até que ele pode ter se equivocado. Fazendo uma decomposição das classes em sua unidade básica, o indivíduo, eu diria que a luta da classe não é pelo poder. Diria mais: na verdade eles são avessos ao poder. Estar no poder implica liderar, e para liderar é necessário tempo, disponibilidade, pulso, exercício intelectual, dentre outros, e é consenso geral que a imensa maioria das pessoas (nesse caso a classe em questão) não está disposta a todos esse "sacrifícios". Tudo que elas querem é uma vida razoavelmente boa. Uma vida normal, sossegada, com tempo para os seus filhos e para a sua casa; com o seu trabalho estável e a viagem de férias garantida, no final do ano; em uma expressão: desejam uma vida confortável (obviamente que terá aqueles que anseiam o poder, mas sim enquanto unidade básica, e não como classe constituída). E sob esse pano de fundo que entra em cena a figura do líder sindical.
  Quem é o líder sindical? Por vezes vemos que esse líder é o cara mais "estudado", o mais engajado no movimento, o que fala em nome da categoria. Em síntese: ele é a elite dos dominados. Bourdieu fazia referência a esse líder como "o porta-voz" do grupo. Em uma assembleia, ele é o grupo, se reveste do mesmo e o personifica. A figura do líder sindicalista ganha um status tal, que este é autorizado a falar pelo grupo. Pensemos, por exemplo, o líder do sindicato dos rodoviários. Agora pensemos na quantidade de pessoas que fazem parte dessa categoria e, consequentemente, quantas pessoas estão sendo representadas na pessoa do líder. Pensamos em quantas vozes estão se pronunciando quando ele abre a boca.
   Um outro ponto que merece ser observado é que na mesma medida que o líder é a voz do grupo, o grupo também pode vim a ser a voz do líder. Ora, como vimos, o líder é aquele cara que estudou mais, o que está na linha de frente da causa. É aquele que sabe a necessidade da classe. Munido do capital cultural (conhecimento), ele possui artifícios  o suficientes para exercer o poder de convencimento (este o mais legítimo poder simbólico) sobre os seus regidos.
   A relação classe X poder deve ser analisado tanto da vertente de baixo para cima, quanto de cima para baixo. É fato que muitos desejam o poder, entretanto vejo com certa cautela a idéia de que todas as classes anseiam o poder. Vejo na verdade, certa aversão ao mesmo.

PS¹- Não é intenção do texto, muito menos do blogueiro, deturpar o trabalho dos líderes sindicais, nem tampouco pó-los como meros manipuladores, e as classe regidas por eles como massa-de-manobra. Longe de generalizações, o texto tem por intuito abordar situações que, frequentemente, ocorrem no seio da sociedade.

PS²- Apesar de o título sugerir, nunca houve de fato algum tipo de "duelo" entre Pierre Bourdieu e Karl Marx. É bem verdade que existem alguns asteriscos do primeiro em relação ao segundo, mas nada que possa ser considerado como uma crítica ferrenha ou uma briga (pelo menos não no humilde conhecimento deste blogueiro). O que houve foi um confrontamento, por parte do blogueiro, das teorias de ambos.

domingo, 3 de abril de 2011

A irresponsabilidade manda e o Mosquito da dengue executa

Por André Andrade


Um grave problema endêmico que persiste em nosso meio e que tende a se agravar com a grande incidência das chuvas no verão é a dengue. Transmitida pelo Aedes aegypi, o mosquito “odioso do Egito” espalha a calamidade que mais atribula a vida da região pós-cacauicultora, depois da vassoura-de-bruxa. Certo é que todo ano existe essa apreensão de se viver uma pandemia regional devido aos altos índices de infestação do mosquito, todavia, quem provoca a possibilidade de reprodução do mosquito não deveria ser a verdadeira responsável por essa situação?
O mosquito é um bichinho irracional que por instinto, se alimenta de algumas gotículas humanas, e carregando o vírus da dengue, devido a sua condição genética, involuntariamente transmite o vírus da dengue. Quem permite a possibilidade de reprodução do vetor da dengue, deixando acumular águas em recipientes abandonados nas ruas, quintais e terrenos baldios é o chamado Homem da Sapiência. A ausência de escrúpulo de quem joga garrafas de bebidas pelas janelas dos ônibus, que deixa tonéis de águas descobertas, ou joga recipientes em terrenos abandonados propicia a formação de assassinos irracionais que matam sem culpa, sem consciência.
A proliferação do mosquito é a conseqüência da absurda irresponsabilidade humana que já se cansou de ouvir dos perigos da doença, mas que insiste em intentar negligentemente contra a própria vida. Estamos combatendo o inimigo errado. Temos de atentar contra a falta de consciência das pessoas. A figura do mosquito disfarçado em nosso meio em uma roda de samba, por exemplo, é uma forma errada de pensar o problema, e desencadeia uma forma errada de combatê-la. O alvo não é o mosquito, e a irresponsabilidade humana.
Deve-se fazer uma campanha em que demonstre a fonte primária do surgimento do mosquito, e atinja desta forma a consciência das pessoas. Deve-se também mostrar os resultados das faltas de responsabilidades tendo como maiores conseqüências a morte das pessoas, mostrando que evitando o acúmulo de água em recipientes, ou seja, gestos ínfimos podem fazer com que mortes possam ser evitadas.
Estamos numa guerra no qual os irracionais são os mandantes propiciadores do surgimento dos mosquitos, simples executores que agem por instinto, por bom senso da natureza.