sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

d'O Gambito

Por André Andrade


Necessário há de ser
Não tem pra onde correr
Estamos imersos numa batalha
Cujas trincheiras somos nós

De prontidão a guardar os flancos
E a avançar ao território alheio
Em campos esquadrilhados
O inimigo é cromaticamente assimétrico

O impasse que bloqueia a passagem
O passe que destoa das circunstâncias

Excelsa Vitória de Pirro!
Que para vencer é preciso perecer
Tens de ceder, do contrário, tudo atravanca
Ao menos que a Nobre Cavalaria
Ouse saltar sobre as trincheiras perfiladas

A porfia se torna tensa
Afinal, quem resistirá à desavença?
Destemido seja o inimigo
Que de uma misericórdia ingloriosa
Ceifa do tabuleiro a incógnita

Não obstante, é a vez do desafiante
Que na reciprocidade inversa do movimento
Dilacera cheio de vingança, a outra peça titubeante

Os desbravadores não são nobres
São peões a chocar-se com seu infortúnio
De servir de escudo para a velha aristocracia
Que finca sua flâmula na terra conquistada
Umedecida com a seiva carmesim do camponês inocente
E conclama-se vitoriosa à custa do indigente

Os homens a conquistar mundos desconhecidos
Impérios soerguerão das ruínas dos impérios malogrados
Conquanto que os mais fracos amorteçam a força do impacto
E desapareçam da história que só há lugar para heróis

Avançam os guerreiros e seus reinos
Os homens sempre hão de guerrear
E perpetuar a sede de dominar
O sangue dos mais fracos hão de jorrar

Sempre foi assim, assim sempre será.

P.S.: AOS FREQUENTES VISITANTES, DEU PRA PERCEBER QUE ESTAMOS EM "MÓDULO" DE FÉRIAS, DAÍ A RAZÃO DOS "POEMINHAS". DESDE JÁ NÓS DO PANÓPTICO AGRADECEMOS AS VISITAS DE TODOS E DESEJAMOS UM FELIZ ANO NOVO!! 


sábado, 25 de dezembro de 2010

Vida de Cágado

Por André Andrade


Defronte à parede
Contemplo o microcosmo que me cerceia
Não percebo nada em derredor, estando só com minha dó
Nem vejo o dia clarear, pra mim o sol não há de raiar

Todas as coisas mudam
Se não mudassem não seriam coisas
A não ser o tempo que não muda, só passa
O tempo e eu, uma não-coisa

Da comida ao estrume
Persisto em meu costume
Carrego o peso de minha existência
Mas não  reclamo não, casco duro como a vida
Reclamações não irão mudar a minha condição

Vivo a olhar na parede
E beber água quando sinto sede
Olho ao meu redor com minha visão limitada
E a grandeza do universo me diz que não sou nada

Recolher-me-ei em meu canto, preenchido de desencanto
A continuar no meu ócio, ócio fatigante
Recolher-me-ei em meu casco
A contemplar o tempo passar num fiasco

Eu e o tempo, tudo passa.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

PROFISSÃO PROFESSOR (Eu sou um Fracasso?)

Por André Andrade


Este texto visa refletir acerca do ser professor. Há poucas semanas foi divulgado o novo PNE (Plano Nacional de Educação) no qual o Ministro da Educação Fernando Haddad apresenta as metas que a serem atingidas nessa segunda década do século XXI. Dentre as principais metas a serem atingidas encontra-se a valorização salarial do professor, que nas palavras do Ministro, será imprescindível, caso queiramos uma educação de qualidade. No mesmo Hipertexto (página da carta capital) um comentarista alertava: “- que tenha a mesma urgência que teve a dos deputados”. Tendo em vista essas digressões, resolvi escrever essa apologia ao professor.
No último dia como estudante do ensino médio, saí da sala com a certeza de que seria tudo, menos professor. As aulas de meu professor de História (in memorian, falecido há um ano), que eu odiava, me deu essa certeza, só que desencadeou o efeito contrário. Recebi uma bolsa do Prouni no primeiro ano de execução do projeto para cursar História e acabei me vislumbrando pela disciplina. O outro vislumbramento ocorreu justamente em sala de aula. Que sensação boa senti ao entrar numa sala de aula e compartilhar o que eu havia aprendido com os que ali estavam presentes. A docência beira a filantropia. Beira, porque as mãos do capitalismo que desencanta tudo em que toca não nos permitem afirmar que ensinar é um gesto humanitário, de auxílio ao próximo.
Não havia escolhido isso pra mim, e minhas impressões (antigas) sobre a profissão ainda me deixavam meio cético quanto seguir a temida carreira. Resolvi seguir no curso, e ver o que dava. Familiares me chamaram a atenção, verbalizando coisas como “- Você não vai mudar o mundo; Você não vai ser o herói da nação”, mas em nenhum momento abri a boca pra dizer isso, só disse que seguiria a profissão da docência. Porém, tal crítica me fez temer se isso não era apenas a síndrome do noviço rebelde, que de início vê a esperança (de Pandora) em tudo e que depois sofre a crise da desilusão provocada pela rotinização da vida profissional . Afora outros fatores como a falta de valorização do professor.
Então transformei minha temerança em um problema a ser conhecido, pra evitar que ela viesse a me conhecer aos poucos e aí desembocar na síndrome do professor mal resolvido com a vida e consigo mesmo (diacho de síndrome de nome grande, uma sigla, por favor: SPMRCVCM...é, num resolveu...). Cheguei a fazer uma pesquisa com uma turma lá da universidade sobre a desilusão do professor, e através de um questionário aplicado a 60 professores, descobrimos que somente 2 estimulam seus filhos a serem professores, e mesmo assim...Bem, isso confirma um fenômeno que deve ocorrer muitíssimo na região no que diz respeito ao curso que a maioria escolhe para cursar na Universidade pública daqui, a UESC. No meu entender, a grande maioria escolhe os cursos de licenciatura (a maioria das vagas ofertadas e de menores concorrências) pela disciplina a ser estudada, e não pela área de atuação. Não é a toa que os cursos da licenciatura possuem uma característica muito forte de bacharelado, pois o seu público se dedica mais à pesquisa de seu campo do saber ao invés de criar núcleos de ensino e outras ferramentas que poderiam aperfeiçoar a educação da região pós-cacaueira.
De quem é a culpa? No trabalho, supúnhamos que não só a valorização salarial é um fator preponderante, mas também a valorização social. Crescemos ouvindo que seremos ou médico ou advogado, aos que conhecem a profissão (e seus ganhos) lembram do engenheiro, mas o professor não é uma profissão apreciada a ponto de se tornar o fetiche do povo. Em que somos diferentes das profissões anteriormente citadas? Lidamos com saúde educacional, direitos e deveres sociais e a engenharia do saber. Exijo toda a pomposidade dedicada aos “doutores” acima citados para os professores também. Simplesmente não somos lembrados pela sociedade como contribuintes para a construção do bem-estar social. Lembra-se que o ensino está uma lástima, que professores são incompetentes, mas não mensuram o quão dispendioso é o trabalho de um professor.
Assim como um médico consulta seus livros para estudar uma cirurgia a ser feita, ou um advogado que debruça-se sobre os seus calhamaços para ter conhecimento das leis e assim saber como agir diante de um tribunal, o professor tem de estar a visitar seus livros, sua biblioteca para renovar, relembrar, re-formar seu conhecimento adquirido na faculdade para que possa em sala de aula transmiti-lo. Aquilo que ele compreende de seu campo de saber é passado aos estudantes que terão de apreender e aprender seus ensinamentos de forma ativa, ruminando o que acabou de saber para efetivação da aprendizagem, ao menos essa seria a situação ideal, mas isso necessariamente não acontece pelo agravante motivo que a diferencia das outras profissões, e a torna, a meu ver, a mais difícil.
O médico não atende de uma só vez todos os seus pacientes, não ouve a queixa de 40 pessoas dentro de seu consultório e não as receita a todos num mesmo raio de voz. Assim como um advogado não houve todos os seus clientes de uma só vez e não tem de levar todos os casos em coletividades, pois cada um tem sua exigência, seu problema. A profissão do professor tem essa característica massificante, lidamos com muitas pessoas ao mesmo tempo. A depender da carga horária, poderemos ter falado ao fim do dia para um público de mais ou menos 200 pessoas, e isso é muito dispendioso.
Nesse sentido, nosso trabalho não é menos importante que o do médico ou do advogado, pois se um cuida da ordem sanitária e o outro dos conflitos gerados pelas relações sociais, nós cuidamos para que se lembre que somos uma humanidade que comunga da constituição dos saberes universais. Que esses saberes transmitidos aos neófitos da sociedade servem para localizá-los dentro do contexto em que vive sua espécie: o sapiens.
A sapiência. Se é isso que nos diferenciam de espécies anteriores, é porque inventamos elementos eficazes para transmitir esses valores constituídos pela humanidade: a escola, a educação e o professor. O professor tem a árdua tarefa de aprender esses valores e ensiná-los àqueles que comporão essa conjuntura humanitária. É triste saber então que o piso salarial do professor no Brasil de 1,020 R$ demorou dez anos a ser firmado legalmente (e mesmo assim não é obedecido pelas prefeituras e os Estados, mesmo já estando o piso salarial em 1,200 R$) e ver deputados votando o seu reajuste salarial astronômico na velocidade da luz...ver que a profissão é abominada por muitos...ver que somos tidos como mártires pelos nossos familiares...ver que toda a sua esperança de mudar, transformar, é abalada por motivos como estes dos deputados, e nesse sentido, faço uma pergunta exclamada pelo meu caro amigo Humberto: eu sou um fracasso?
Dediquei todo meu esforço em todas as aulas que tive o prazer de dar, e ainda sinto por ter abandonado o meu último emprego (lembranças ao pessoal do PROJOVEM). É um desafio pra mim, fazer acontecer a aula perfeita, que você não sente instantaneamente se ela é boa ou não, mas que sedimentada na mente dos estudantes, lhe reconhecece na rua e diz: aquele é um professor. Mais do que isso, é perceber que o desempenho do seu papel promoveu uma mudança, ao menos na cabeça desses estudantes, pelo fato de ter mostrado a eles que conhecer não é um incômodo, é incomodante. Fracassar...creio que professorar não é fracassar, somos a prova concreta de que insistir ainda vai valer a pena, eis a minha convicção que a força do tempo não vai corroer porque não é uma euforia, é uma obstinação.

Dedico este texto a todas as professoras e professores de todo o Brasil que vivenciam cotidianamente a profissão e sentem na pele as dificuldades do ofício, e mesclam a docência com o filantropismo, pois dinheiro nenhum paga esse trabalho.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Falando de Burocracia




Por André Andrade


 A Burocracia no imaginário brasileiro é algo pesadamente pejorativo. Todo processo que se resolve frente a uma instância pública levam o selo de “burocrático” por se mostrar um processo atravancado e que despende muito tempo para ser resolvido. A Burocracia conceituada a partir de um viés sociológico é mais que isso, e não é tão danosa assim se pensarmos como Weber, um dos primeiros sociólogos a estudar o assunto. Não querendo aqui dar nenhuma aula de sociologia, e nem se mostrar hermético (Ops, dificilmente compreensível, rsrs) o problema que quero expor é o seguinte: A Burocracia é necessária ou dispensável? Podemos pensar numa desburocratização, por exemplo da política? (e aí subentende-se que outras instituições também passam por  processos de burocratização, como a família). Antes disso, explicitemos em linhas gerais o que é Burocracia para que o problema fique melhor evidenciado.
Do francês Bureau, que quer dizer escritório, secretaria, ou num linguajar político, repartição pública, e daí juntando com “Kratos” temos o governo das repartições públicas. Então, de modo bem generalizado, podemos dizer que a burocracia é uma forma de organização que o Estado Moderno faz uso, onde encontra no funcionário público especializado em sua função e inserido numa hierarquia de cargos no qual estão interligados a partir de uma rede de subordinações entre gerentes e gerenciados. Estou explicando tomando como referência a Política, o qual a Burocracia se manifesta de forma mais perceptível por todos nós. Pretendo em um outro texto discutir a burocratização de nossas vidas, breve, espero.
Primeira pergunta: Por que essa forma de organizar-se? É uma forma racional de administração que possibilita “previsões”. C-O-M-O assim? A especialização das funções distribuídas e ramificadas em todo o sistema das repartições promove a rotinização dessas funções. Todas as ações são calculáveis, e, portanto, todos os serviços e demandas ficam passíveis de serem previstos. Desse modo, cria-se a estabilidade administrativa e organizacional que todo sistema político, institucional (o Estado, no caso), precisa para promover-se, perpetuar-se no poder, e até pra fins de estabilidade social, que necessariamente não significa que tudo está nos conformes, afinal, nem tudo são flores.
A razão do termo ser tratado como pejorativo pelo senso comum estão bem fundadas. Houve uma fragmentação demasiada do sistema burocrático. Ocorreu uma reprodução de subordinações tornando o sistema partido em divisões infinitesimais. Cada gerente tem seu gerente, e ninguém sabe quem é que comanda, quem dá o “apito final”. Com isso, o que era pra ser eficiente e auxiliador vem promovendo um atravancamento da máquina estatal. Para fins conceituais (e elucidativos), chamaremos de Burocracia aquilo que foi exposto no parágrafo anterior e de Burocratismo, a sua disfunção relatada (repetindo, de forma bem genérica) nesse parágrafo. Tudo isso para chegar ao clímax, ou, no pior de seu problema mais sintomático, a especialização das funções.
A especialização da mão-de-obra é o pior problema da Burocracia, ao meu ver. Funcionários que se especializam em suas funções e que por isso, se tornam donos de seus cargos, apropriando-se de espaços institucionais. Contarei uma historinha real pra ilustrar melhor. Visitei com a turma de Ciências Sociais da UESC a aldeia indígena Pataxó de Porto Seguro. Lá, ouvimos um probleminha relatado por um índio da tribo no que diz respeito à ausência de um Pajé na tribo. É que o último que detinha todo um conhecimento ancestral das plantas não imaginava que morreria tão cedo (o Pajé estava na “casa” dos setenta!!! Fato é que a média de vida dos índios pataxó ultrapassa os 80 anos, e olhe lá) e não se preocupou muito em já passar todo o seu saber ao seus dois iniciados (não é qualquer um que pode ser pajé, há toda uma trajetória mística e séria detectada logo na infância dos aspirantes ao cargo). Aconteceu que infelizmente o pajé faleceu e levou consigo todo o conhecimento milenar da medicina natural, o que deixou a tribo sem pajé. O caso é meramente ilustrativo, pois nesse caso, foi uma fatalidade, e no nosso caso,  é uma banalidade.
As pessoas apoderam-se dos cargos públicos, tomam pra si todo o conhecimento necessário para execução de suas funções, e de forma prepotente, tornam privado o que é público, não se preocupando em formar novos ocupantes dos cargos, criando assim impedimentos corriqueiros, resolvidos com algum suborno (esse “jeitinho” brasileiro...dá nos nervos!). Não direciono essa crítica aos cargos públicos conseguidos mediante concurso público, o que requer um conhecimento da legislação referente a assunto, além de um espaço maior pra ser debatida tal questão, já que a critica teria de ir de encontro às estruturas do sistema burocrático, ou seja, uma Tese!
Me referirei aos cargos políticos, que de 4 em 4 anos vencem, mas de 4 em 4 anos, vemos as mesmas figuras no comando. Suponho que o sucateamento da máquina estatal se dá pelo fato de políticos tornarem os cargos públicos cativos à sua personalidade. A questão é simples, quanto mais tempo ocupa-se num cargo político, mais o burocrata tende-se a acomodar-se, a não inovar-se, a corromper-se. Pra mim, político não é uma profissão, é um estado imputado a qualquer cidadão ou cidadã.
Esclarecer-me-ei falando dos franceses. Na Comuna de Paris, fato ocorrido no século XIX em que operários tomaram Paris e fundaram um Regime Socialista que não durou mais de 2 meses, houve uma coisa intrigante. Os “Comuna” instauraram um sistema circulatório no comando político, pois sabiam que as pessoas não podiam se acostumar no poder, deixar dominar-se pela Fortuna, como diria Maquiavel, em detrimento da Virtù. No Maio de 68, os estudantes lançavam ferrenhas críticas a burocracia “proletária” instaurada na URSS. O que era pra ser uma ditadura (o grupo revolucionário que se tomou o poder para passá-lo para os proletários) de transição de sistemas para o firmamento do Estado Comunista se transformou numa ditadura (o grupo tirânico que apoderou-se do poder sem alternância nos cargo). Nesse ínterim, os franceses faziam questão de criticar e não incorrer no erro exposto pela crítica, ou seja, em suas manifestações, não existia nenhum representante, nenhum líder, e os estudantes eram apáticos ao partido comunista francês, visto como seguidor do marasmo soviético. Tais críticas promovem o ressurgimento de idéias anarquistas que aliou-se às premissas do movimento Punk. Ressurge daí a velha discussão dos velhinhos senis (brincadeirinha) Marx e Proudhon: é ou não é necessário a Existência do Estado?
Bem, eu e minha mania de escrever demais, mas vou encerrar pontuando algumas questões que me afligem desde que comecei a pensar nisso tais como: por que a burocracia deu errado na URSS e deu tão “certo” no mundo capitalista? A Burocracia é a fonte da Corrupção? Existiria alguma alternativa ao sistema burocrático? Quiçá eu possa ampliar a discussão da temática aqui e falar, por exemplo, do plano do Ex-ministro da Fazenda Carlos Bresser de uma reforma gerencial. Não seria enfadonho fazer essa discussão aqui, já que  é um problema pertinente em nossa vida contemporânea.

domingo, 5 de dezembro de 2010

ANALFABETISMO ELEITORAL

Por Humberto Rodrigo


O brasileiro é taxado de não se envolver politicamente. O desdém a respeito da questão eleitoral perpassa pelo total alheamento ao cenário eleitoral do país, alheamento esse que vai desde o esquecimento dos candidatos em votou na última eleição até o completo desconhecimento das políticas públicas que têm sido tomadas (ou não) em prol da comunidade em que este está inserido. Neste cenário a própria cobrança aos governantes se torna fragilizada uma vez que não está embasada de nenhuma concretude, pois sem o conhecimento do que ocorre ao redor, não nem há como utilizar o jargão “’o prefeito’ não faz nada além de roubar”. Acusações à parte existem vários exemplos de comunidades que saíram, por conta própria, em busca de melhorias para o seu próprio meio. Exemplos desse tipo nos remete tanto à questões referentes a idéias tais como o “partido não-governamental” como, por outro lado, à questões a respeito da (falta) consciência eleitoral.
Dizem às tantas que brasileiro não é um povo engajado politicamente, que não tem consciência política. A esses eu digo-lhes que estão sendo míopes. O problema não é nem que não têm consciência política, o problema é que não têm uma EDUCAÇÃO POLÍTICA. A coisa é pior, usando de um ditado popular: “o buraco é mais embaixo”. Não ter consciência é achar que apenas os representantes do executivo é que precisam ser escolhidos cuidadosamente, enquanto que os representantes do legislativo são escolhidos porque um amigo indicou ou ainda pior: são escolhidos no caminho à secção de votação. E isso acontece não nego. Entretanto, não ter uma educação política é não acompanhar, sequer, a propaganda eleitoral; não acompanhar os debates televisivos. É fato que os EUA simplesmente PARAM em dias de debates na “telinha”. Chegamos ao cume de eleger um presidente por ele ser “bonito” [sic]. Isso é o ápice do analfabetismo eleitoral. A falta de educação política é tão mais grave que a falta de consciência, na medida em que a falta de consciência está inserida na falta de educação, afinal como se ter uma consciência daquilo que não se conhece?
A falta de uma educação política flerta com idéias antidemocráticas. O pressuposto passa por uma questão elementar: afinal qual o sentido de dar o direito de votar a quem não saber exercê-lo? Acaso você se submeteria a uma operação com um médico que não sabe fazer cirurgias? Ou confiaria o seu sonho de construir a casa própria a um pedreiro que não sabe construir casas? Se é bem verdade que hoje temos uma opinião pública suficientemente forte e desenvolvida, capaz de se opor veementemente a uma investida de cerceamento da democracia, também o é que o panorama de analfabetismo eleitoral favorecem aos maus políticos: Platão há milênios atrás já se preocupava com a possibilidade de que o político com a melhor retórica assumisse o poder, em detrimento daquele que tivesse as melhores propostas. O povo poderia facilmente ser enganado por aquele candidato que possuía uma boa oratória, afinal, as massas são movidas pela emoção ficando a razão em segundo plano. O temor de Platão tem se tornado realidade: quanto menos uma população se engaja politicamente, mais o político com melhor retórica assume em lugar daquele que tem melhores propostas.
Em resposta a essa falta de comprometimento com a política, idéias como a de Alexis de Tocqueville vem como uma proposta plausível: Tocqueville (em A Democracia na América) sugeriu a criação de pequenos grupos de ação (vide textos anteriores a respeito dos Partidos Não-Governamentais). Exemplos como a concepção de uma liga comunitária nos bairros (que seria responsável tanto pela mobilização de necessidades a priori – como mutirão de limpeza ou em prol de um vizinho que está necessitando de ajuda – quanto pela cobrança junto às autoridades competentes) surgem como modelos bastante acessíveis. Em sua viagem aos Estados Unidos (isso em meados do século XIX), Tocquecille ficara espantado com a capacidade de mobilização politica dos estado-unidenses. Esse tipo de mobilização é tão reflexo da educação eleitoral como sua causa. Sim, porque a partir do momento que em se está lidando com a política diretamente, a tendência natural é o maior envolvimento. O analfabetismo, ao contrário, cria o ambiente ideal para a proliferação de políticas/políticos desastrosos e danosos para a sociedade. Tocqueville ficou a abismado com a capacidade de organização e a consciência política dos estado-unidenses. Eu também fiquei. 

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Fragmentos Avulsos...Pô, a gente só vê branco?!



Por André Andrade



Tudo começou como uma brincadeira. Não tenho prazer em assistir TV, mas reconheço que devemos ir além de nossas vontades se quisermos criar vínculos sociais e enturmar-se com seus grupos. Certo, aceitei abrir mão de minha estranheza com a TV, mas logo que me sentei frente à dita cuja me lembrei dos motivos que me fizeram deixar de dar atenção a este hipnotizante aparelho. 

Não é preciso ser um bom observador para perceber as distorções. Nas novelas, empregadas são negras e patrões são brancas. No “barraco” da favela sempre rola um churrasco confraternizador que fortalece a unidade da “comunidade” e nessa cena todas personagens são negras . Num desses realitys shows instantâneos de concurso de modelo, percebe-se a presença de uma negra mais como forçosamente encaixada no esquema do programa do que escolhida espontaneamente. Começo a contar quantas pessoas negras aparecem em propagandas e logo desisto, pois não se vê nenhuma. De repente, eis que surge uma representação destacável da africanidade em algum papel de novela, mas aí nota-se algumas singularidades imputadas ao seu papel. Normalmente é uma personagem com qualidades pouco estimáveis, quando não, são totalmente padecidos, precisando de ajuda dos brancos. As novelas esforçam-se em serem politicamente corretas (sic! 3x) mas distorcem a estética negra ao tornarem lisos os cabelos crespos. E quando uma atriz negra protagonizou certa novela, era da cor do pecado...

Curioso, há pouco vi essa atriz fazendo propaganda para que as pessoas assumissem sua cor NEGRA, por ocasião do censo. É curioso porque ninguém apareceu para fazer o mesmo tipo de propaganda para o branco. Sempre o negro está em questão enquanto que o branco está muito bem em seu lugar, vai tudo tranquilo...se fala em negritude, mas e a branquitude? Se se discute o preconceito contra o negro, é porque existe alguma outra cor que contrasta com essa, no caso, a branca. Se existisse somente uma cor na Terra, não haveria preconceito (pelo menos de cor!)! Aonde quero chegar? Bem, conquanto não colocarmos na pauta de discussões a branquitude, estaremos andando em círculos, pois a solução não está na conscientização de que somos todos iguais, porém diferentes, aforismo este que não se encaixa com a brutalidade do contexto real. Está no fato de por em xeque a cor branca tida como referência. A cor branca se torna referência quando ela é omitida desses debates, quando ela aparece como maioria grotesca na Tv, quando você vai ao shopping e parece que estamos assistindo a Tv. Destrone a branquitude de sua posição de comodidade, e construamos um diálogo onde todos serão expostos, todos serão visados, porque enquanto insistirmos em expor somente a imagem do negro, o alvo será somente o negro, e o arqueiro, o branco...

Fui há algumas semanas no shopping e lá vi uma exposição de fotos com a temática grávidas, e deduzi que em meio a umas 20 fotos, encontraria como se convencionou na TV, ter ao menos uma negra dentre as fotografadas. Deduzi errado. Dessa vez não houve dissimulação, resolveu-se não colocar nenhuma mãe grávida de pele negra na exposição. Dentre todas essas situações observadas eu surtei: -Pô, a gente só vê branco??!!! Estão pregando uma representação de mundo que não condiz com a nossa realidade! Olho ao meu redor e vejo uma miscelânea de cores e matizes que mostram a força de nossa miscigenação. Do cabelo às unhas do pé, estamos imersos numa confluência de fenótipos que nos tornam indistinguíveis uns dos outros. Aí eu vejo crianças brancas tomando sorvetes e crianças negras engraxando sapatos. Jovens brancos com mochilas e jovens negros com flanelinhas. O doutor é branco e o analfabeto é negro. Sei que alguma coisa tem mudado, mas as disparidades ainda são gritantes, basta ter um olhar estatístico...

Vi um panfleto na universidade que tratava do recente fato da mãe de santo que teve seu terreiro invadido por policiais sofrendo com isso agressões e discriminações dos milicos. O fato se tornou conhecido e foi parar até nas mesas do governador. O folhetim gritava: não vemos policiais invadindo igrejas e espancando pastores e padres...

 Então, de onde provém o preconceito? No que diz respeito à televisão, a minha opinião é que estamos sendo treinados pra enxergarmos somente branco, e por isso a discriminação se mostra nua e crua nas ruas das cidades, mas quem vai parar pra ver isso? 

Não sei se todos concordarão, mas eu acho que a pergunta mais idiota que se possa fazer a um brasileir@ (pra seguir o modismo) é: qual é sua cor. O meu nariz é senegalês...sou miscigenado! Podemos ter um fenótipo de branco e um genótipo de negro e virce-e-versa, afirmam os biólogos. Então, me pergunto, qual é a relevância de perguntar “Qual  a sua cor?”  pra um brasileiro? Provar que o preconceito está mais vivo do que nunca? Mas pra isso não precisa de questionários, censos, basta assistir televisão.

sábado, 27 de novembro de 2010

O PESO DA COR

Por Humberto Rodrigo


“Quando eu era pequena sempre ouvi meu pai dizer: ‘filha, estude mais um pouco. Somos negros e, por isso, temos que nos esforçar mais para termos as mesmas oportunidades que os brancos’”. Com este relato de uma colega, inicio o texto desta semana, rememorando o Dia da Consciência Negra comemorado esta semana (20/11). Alguém ainda duvida que a cor da pele é levada em conta como critério de desempate em seleção de emprego? Ledo engano daqueles que acham que não. Essa suposta democracia racial (conceito esse já embebido de preconceito) existe no Brasil, não passa de véu imposto por concepções neoliberais que, com sua delicada aparência, cobre as vistas dos menos atentos, quanto às questões ÉTNICAS patentes na sociedade brasileira.
O mercado de trabalho brasileiro é estritamente machista. Os homens dominam os cargos de comando, têm os salários mais altos e são promovidos mais facilmente. Talvez eu tenha esquecido de dizer que esse é o homem BRANCO. A escala de salários, para trabalhadores de uma mesma função, é decrescente conforme o gênero, mas também conforme a cor (?). Para funcionários de uma mesma função, temos uma variação descendente onde no topo com os maiores salários está situado o homem branco, logo em seguida a mulher também branca (entre esses dois há um significante abismos), próximo, mais ainda atrás, vem o homem o negro e por último a mulher negra. A defasagem salarial entre o homem branco e a mulher negra pode chegar a números exorbitantes. A intenção deste artigo, em especial, não é procurar culpados, mas tão somente desmistificar a idéia de que a convivência entre negros e brancos se dá de maneira igualitária onde ambos desfrutam dos mesmos deveres e direitos. Ora, se todos têm o direito de ir e vir, por que o homem negro é quem sempre é abordado pela policia?
A idéia de que vivemos em uma democracia racial não passa de uma falácia, e uma falácia neoliberal legitimadora de distorções históricas. O interessante é notar como esse sistema é extremamente contraditório em seu discurso. Tomemos um exemplo ao acaso: é fato consensual que há uma diferença gritante entre o percentual de negros e brancos nas universidades públicas e essa diferença remonta desde muito tempo atrás, desde o momento que o primeiro negro pisou o solo tupiniquim como um escravo, privado de qualquer direito. Privado até da sua condição de homem, sendo tratado com uma peça. Ora, mas estamos em uma democracia racial, vamos ao plenário e à câmara requerer que sejam reservadas vagas nas universidades até que essa distorção seja corrigida. Democracia... Cadê você? Você ainda está aí? Não, não está. A democracia racial só existe desde que mantenha tudo exatamente como está, a partir do momento em que há a proposição de correção das deformidades históricas, essa “democracia” se esvai. Afinal, como diriam os mais antigos: “farinha pouca, meu pirão primeiro”.
A discriminação velada vai desde expressões pejorativas do tipo: “a coisa ta preta”; “o mercado negro” dentre outras (não é engraçado não haver expressões desse tipo com a cor branca? Mais: qual a cor da pomba que simboliza a paz e qual a cor do gato que simboliza o azar?), passando pela necessidade da criação de uma lei que obriga que em comerciais televisivos de cada cinco atores pelos menos um seja negro (nem direi que a lei não é cumprida, apenas sugiro dois exemplos: prestem atenção nos comerciais da Vivo e da Skol), e finalmente desembocando em falas que sugerem que “negros, têm preconceitos contra si próprio”. O chamam de “preconceito contra si próprio” é na verdade INTROJECÇÃO. Ora, o menino negro cresce ouvindo expressões que deterioram a sua cor; liga a televisão e assiste programas em que todos os apresentadores são brancos; as crianças juntas aos apresentadores também são brancas. A introjecção não é algo voluntário e/ou deliberado é originária da formação no seio social. Seio esse que é hostil à sua cor, que lhe impõem se esforçar mais e ganhar menos. Tenho uma proposta: deveríamos mudar o nome de Dia da Consciência Negra para dia da Consciência Branca. Seria o dia nacional de acordar pra vida e ver que esses vícios de linguagens perpetuam uma a idéia de que o preto é ruim e o branco é bom. Teriam consciência que a respeito da necessidade das cotas ÉTNICAS como uma medida de médio prazo, afim de sanar a disparidade notória, nas universidades. Seria o dia também, de se perceber que politicamente incorreto é chamar de “moreninho” e não de “negro”, e que a África não é um país, é, antes, um continente que abarca tantos países quanto culturas. Logo, não é possível tratá-la como um bloco homogênico, pois ela não é. E por fim, que se entenda de uma vez por todas que a única raça que existe - respeitando as particularidade de cada etnia - é a RAÇA HUMANA.
O pai daquela colega ao propor-lhe que estudasse mais pelo fato de ela ser negra, talvez o tenha feito pelo reflexo da introjecção, mas talvez por já ter experiência o suficiente para perceber que a sua cor lhe pesava. E esse peso que ela carregaria para o resto da vida lhe traria vários infortúnios, mesmo ela vivendo em uma “democracia racial”. Por saber que sua filha talvez fosse ganhar pouco por ser mulher e menos ainda por ser uma mulher negra. Ao ter essa conversa com ela me lembrei do filme À Espera da Felicidade. Mais especificamente no quando o personagem principal, vivido por Will Smith, tinha conseguido um estágio e se transformara no “menino de recados” do orientador: era ele quem ia buscar o café, era ele quem ia manobrar o carro. Era o único que tinha a necessidade de trabalhar, tinha que fazer a atividade duas vezes melhor além, é claro, de ser o único negro. Pode ser que o pai da referida colega tenha assistido esse filme (acredito que não) e se identificado. Mas, infelizmente, ele ainda está certo: ainda é necessário que estudemos duas vezes mais, pois o peso ainda se faz sentir.

Fraternalmente dedicado à Arilene Soares.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Um Partido Não-Governamental: como é possível?



 Por André Andrde

 Por que a subversão deve ser tão barulhenta e espalhafatosa se a opressão age silenciosamente em nosso meio?

Depois de ter feito uma breve introdução fundamentando o porquê de um partido não-governamental (vide Excerto sobre o Partido Não-Governamental), o PNG, pretendo reafirmas as bases que sustentam tais idéias do partido articulando suas propostas com possíveis ações concretas. A práxis partidária se daria inicialmente num contexto escolar sobre a tutela dos professores que seriam os primeiros militantes do PNG. Tendo tal preceito em voga, faz-se necessário o uso de uma pedagogia crítica que combine a ideologia do partido, a emancipação[1] do ser a partir do conhecer, com a militância conjunta dos partidários nas escolas.
O preceito crucial que vai dar ao PNG toda a sua forma e característica peculiar é a concepção do voluntarismo. O agir deve se pautar em ações antiutilitaristas. Logo se percebe no contexto escolar a des-motivação dos professores pelo fato de vivenciar o menosprezo que o Estado tem para com as Escolas. Acontece que esta desmotivação é gerada justamente por conta de conceber que a mudança somente será possível quando o Poder Público tomar providências sérias quanto aos problemas da Educação. Essa forma de ver a política torna inativo agentes que detém determinadas características que podem transformar a realidade. Os professores formam uma classe trabalhadora esclarecida cuja profissão é transformar o indivíduo que não detinha certos saberes e que agora os conhecendo, agirá de forma diferente do qual agia (é valido salienta a troca de saberes que provém não só por parte dos professores, mas também de seu público estudantil, mas falar disso nesse texto é demasiado longo, deixarei a discussão para uma próxima oportunidade).
Esperar a motivação por parte das políticas públicas é um investimento de tempo muito caro e pouco satisfatório. Existe ainda a questão de que a classe docente é uma classe desunida, o que é observável em todo tipo de classe trabalhadora, em todo tipo de agrupamento humano. Quero mostrar com esses argumentos que não estou deslocado da realidade, que não estou “elucubrando”, e por isso mesmo, não transporemos essas dificuldades sem agirmos em convenção. Um partido não vem diminuir as diferenças, ao contrário, deve-se fazer a defesa das mesmas, mas o que se pretende com tal são ações convencionalizadas, inscritas num sentido de mudança. Se em todas as diferenças acharmos a ambição da transformação da realidade que está posta, já encontramos a convenção-alicerce de nosso partido.
O sujeito que integra o PNG deve se resumir a uma só característica: mártir. A má-remuneração dos professores, as limitações físicas e materiais do espaço escolar, as rixas políticas (no caso policys) infiltradas nas escolas dentre outros problemas vivenciados no cotidiano escolar não podem se tornar motivos para o enfraquecimento do movimento engajado proposto pelo PNG. As reuniões do partido serão espaços abertos para discussões dos problemas enfrentados, resultados alcançados, novas proposições para determinadas ações. A coesão do partido se fundará no grupo, e concomitante a isso, no ideal basilar: a emancipação do estudante a partir da práxis docente. Formulações de pedagogias radicalizantes serão prerrogativas que trarão a inovação para o agir docente combinado-se assim com a proposta de uma educação libertária. As salas de aula devem se transformar em lugares de micro-revoluções localizadas nas mentes dos seres pensantes.
Bem, fico com a sensação de que escrevi muito e disse pouco, mas é porque o que quero justamente passar se resume a três frases. Não agiremos na realidade transformando-a sem essa concepção de que podemos politizar nossas ações independente das políticas de pleito eleitoreiro. Essa práxis transformadora somente se dará aliada a uma motivação voluntarista. E a idéia mais implícita e expressa na epígrafe: a opressão somente será combatida se usufruirmos de seu mesmo (e eficiente) método: o silêncio.

P.S.: Peço perdão aos leitores e leitoras pelo fato de não ter postado o texto da semana passada, pois tive de viajar, sendo este o mesmo motivo do panoptiqueiro Humberto Rodrigo e aproveito para agradecer as visitas que aumentaram nas últimas semanas, merci.


[1] Emancipar no sentido de se libertar das amarras que aprisionam os seres humanos a um obscurantismo irracional, como no conhecido mito da caverna de Platão, e não no sentido de liberdade, discussão esta mais complexa.