sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

d'O Gambito

Por André Andrade


Necessário há de ser
Não tem pra onde correr
Estamos imersos numa batalha
Cujas trincheiras somos nós

De prontidão a guardar os flancos
E a avançar ao território alheio
Em campos esquadrilhados
O inimigo é cromaticamente assimétrico

O impasse que bloqueia a passagem
O passe que destoa das circunstâncias

Excelsa Vitória de Pirro!
Que para vencer é preciso perecer
Tens de ceder, do contrário, tudo atravanca
Ao menos que a Nobre Cavalaria
Ouse saltar sobre as trincheiras perfiladas

A porfia se torna tensa
Afinal, quem resistirá à desavença?
Destemido seja o inimigo
Que de uma misericórdia ingloriosa
Ceifa do tabuleiro a incógnita

Não obstante, é a vez do desafiante
Que na reciprocidade inversa do movimento
Dilacera cheio de vingança, a outra peça titubeante

Os desbravadores não são nobres
São peões a chocar-se com seu infortúnio
De servir de escudo para a velha aristocracia
Que finca sua flâmula na terra conquistada
Umedecida com a seiva carmesim do camponês inocente
E conclama-se vitoriosa à custa do indigente

Os homens a conquistar mundos desconhecidos
Impérios soerguerão das ruínas dos impérios malogrados
Conquanto que os mais fracos amorteçam a força do impacto
E desapareçam da história que só há lugar para heróis

Avançam os guerreiros e seus reinos
Os homens sempre hão de guerrear
E perpetuar a sede de dominar
O sangue dos mais fracos hão de jorrar

Sempre foi assim, assim sempre será.

P.S.: AOS FREQUENTES VISITANTES, DEU PRA PERCEBER QUE ESTAMOS EM "MÓDULO" DE FÉRIAS, DAÍ A RAZÃO DOS "POEMINHAS". DESDE JÁ NÓS DO PANÓPTICO AGRADECEMOS AS VISITAS DE TODOS E DESEJAMOS UM FELIZ ANO NOVO!! 


sábado, 25 de dezembro de 2010

Vida de Cágado

Por André Andrade


Defronte à parede
Contemplo o microcosmo que me cerceia
Não percebo nada em derredor, estando só com minha dó
Nem vejo o dia clarear, pra mim o sol não há de raiar

Todas as coisas mudam
Se não mudassem não seriam coisas
A não ser o tempo que não muda, só passa
O tempo e eu, uma não-coisa

Da comida ao estrume
Persisto em meu costume
Carrego o peso de minha existência
Mas não  reclamo não, casco duro como a vida
Reclamações não irão mudar a minha condição

Vivo a olhar na parede
E beber água quando sinto sede
Olho ao meu redor com minha visão limitada
E a grandeza do universo me diz que não sou nada

Recolher-me-ei em meu canto, preenchido de desencanto
A continuar no meu ócio, ócio fatigante
Recolher-me-ei em meu casco
A contemplar o tempo passar num fiasco

Eu e o tempo, tudo passa.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

PROFISSÃO PROFESSOR (Eu sou um Fracasso?)

Por André Andrade


Este texto visa refletir acerca do ser professor. Há poucas semanas foi divulgado o novo PNE (Plano Nacional de Educação) no qual o Ministro da Educação Fernando Haddad apresenta as metas que a serem atingidas nessa segunda década do século XXI. Dentre as principais metas a serem atingidas encontra-se a valorização salarial do professor, que nas palavras do Ministro, será imprescindível, caso queiramos uma educação de qualidade. No mesmo Hipertexto (página da carta capital) um comentarista alertava: “- que tenha a mesma urgência que teve a dos deputados”. Tendo em vista essas digressões, resolvi escrever essa apologia ao professor.
No último dia como estudante do ensino médio, saí da sala com a certeza de que seria tudo, menos professor. As aulas de meu professor de História (in memorian, falecido há um ano), que eu odiava, me deu essa certeza, só que desencadeou o efeito contrário. Recebi uma bolsa do Prouni no primeiro ano de execução do projeto para cursar História e acabei me vislumbrando pela disciplina. O outro vislumbramento ocorreu justamente em sala de aula. Que sensação boa senti ao entrar numa sala de aula e compartilhar o que eu havia aprendido com os que ali estavam presentes. A docência beira a filantropia. Beira, porque as mãos do capitalismo que desencanta tudo em que toca não nos permitem afirmar que ensinar é um gesto humanitário, de auxílio ao próximo.
Não havia escolhido isso pra mim, e minhas impressões (antigas) sobre a profissão ainda me deixavam meio cético quanto seguir a temida carreira. Resolvi seguir no curso, e ver o que dava. Familiares me chamaram a atenção, verbalizando coisas como “- Você não vai mudar o mundo; Você não vai ser o herói da nação”, mas em nenhum momento abri a boca pra dizer isso, só disse que seguiria a profissão da docência. Porém, tal crítica me fez temer se isso não era apenas a síndrome do noviço rebelde, que de início vê a esperança (de Pandora) em tudo e que depois sofre a crise da desilusão provocada pela rotinização da vida profissional . Afora outros fatores como a falta de valorização do professor.
Então transformei minha temerança em um problema a ser conhecido, pra evitar que ela viesse a me conhecer aos poucos e aí desembocar na síndrome do professor mal resolvido com a vida e consigo mesmo (diacho de síndrome de nome grande, uma sigla, por favor: SPMRCVCM...é, num resolveu...). Cheguei a fazer uma pesquisa com uma turma lá da universidade sobre a desilusão do professor, e através de um questionário aplicado a 60 professores, descobrimos que somente 2 estimulam seus filhos a serem professores, e mesmo assim...Bem, isso confirma um fenômeno que deve ocorrer muitíssimo na região no que diz respeito ao curso que a maioria escolhe para cursar na Universidade pública daqui, a UESC. No meu entender, a grande maioria escolhe os cursos de licenciatura (a maioria das vagas ofertadas e de menores concorrências) pela disciplina a ser estudada, e não pela área de atuação. Não é a toa que os cursos da licenciatura possuem uma característica muito forte de bacharelado, pois o seu público se dedica mais à pesquisa de seu campo do saber ao invés de criar núcleos de ensino e outras ferramentas que poderiam aperfeiçoar a educação da região pós-cacaueira.
De quem é a culpa? No trabalho, supúnhamos que não só a valorização salarial é um fator preponderante, mas também a valorização social. Crescemos ouvindo que seremos ou médico ou advogado, aos que conhecem a profissão (e seus ganhos) lembram do engenheiro, mas o professor não é uma profissão apreciada a ponto de se tornar o fetiche do povo. Em que somos diferentes das profissões anteriormente citadas? Lidamos com saúde educacional, direitos e deveres sociais e a engenharia do saber. Exijo toda a pomposidade dedicada aos “doutores” acima citados para os professores também. Simplesmente não somos lembrados pela sociedade como contribuintes para a construção do bem-estar social. Lembra-se que o ensino está uma lástima, que professores são incompetentes, mas não mensuram o quão dispendioso é o trabalho de um professor.
Assim como um médico consulta seus livros para estudar uma cirurgia a ser feita, ou um advogado que debruça-se sobre os seus calhamaços para ter conhecimento das leis e assim saber como agir diante de um tribunal, o professor tem de estar a visitar seus livros, sua biblioteca para renovar, relembrar, re-formar seu conhecimento adquirido na faculdade para que possa em sala de aula transmiti-lo. Aquilo que ele compreende de seu campo de saber é passado aos estudantes que terão de apreender e aprender seus ensinamentos de forma ativa, ruminando o que acabou de saber para efetivação da aprendizagem, ao menos essa seria a situação ideal, mas isso necessariamente não acontece pelo agravante motivo que a diferencia das outras profissões, e a torna, a meu ver, a mais difícil.
O médico não atende de uma só vez todos os seus pacientes, não ouve a queixa de 40 pessoas dentro de seu consultório e não as receita a todos num mesmo raio de voz. Assim como um advogado não houve todos os seus clientes de uma só vez e não tem de levar todos os casos em coletividades, pois cada um tem sua exigência, seu problema. A profissão do professor tem essa característica massificante, lidamos com muitas pessoas ao mesmo tempo. A depender da carga horária, poderemos ter falado ao fim do dia para um público de mais ou menos 200 pessoas, e isso é muito dispendioso.
Nesse sentido, nosso trabalho não é menos importante que o do médico ou do advogado, pois se um cuida da ordem sanitária e o outro dos conflitos gerados pelas relações sociais, nós cuidamos para que se lembre que somos uma humanidade que comunga da constituição dos saberes universais. Que esses saberes transmitidos aos neófitos da sociedade servem para localizá-los dentro do contexto em que vive sua espécie: o sapiens.
A sapiência. Se é isso que nos diferenciam de espécies anteriores, é porque inventamos elementos eficazes para transmitir esses valores constituídos pela humanidade: a escola, a educação e o professor. O professor tem a árdua tarefa de aprender esses valores e ensiná-los àqueles que comporão essa conjuntura humanitária. É triste saber então que o piso salarial do professor no Brasil de 1,020 R$ demorou dez anos a ser firmado legalmente (e mesmo assim não é obedecido pelas prefeituras e os Estados, mesmo já estando o piso salarial em 1,200 R$) e ver deputados votando o seu reajuste salarial astronômico na velocidade da luz...ver que a profissão é abominada por muitos...ver que somos tidos como mártires pelos nossos familiares...ver que toda a sua esperança de mudar, transformar, é abalada por motivos como estes dos deputados, e nesse sentido, faço uma pergunta exclamada pelo meu caro amigo Humberto: eu sou um fracasso?
Dediquei todo meu esforço em todas as aulas que tive o prazer de dar, e ainda sinto por ter abandonado o meu último emprego (lembranças ao pessoal do PROJOVEM). É um desafio pra mim, fazer acontecer a aula perfeita, que você não sente instantaneamente se ela é boa ou não, mas que sedimentada na mente dos estudantes, lhe reconhecece na rua e diz: aquele é um professor. Mais do que isso, é perceber que o desempenho do seu papel promoveu uma mudança, ao menos na cabeça desses estudantes, pelo fato de ter mostrado a eles que conhecer não é um incômodo, é incomodante. Fracassar...creio que professorar não é fracassar, somos a prova concreta de que insistir ainda vai valer a pena, eis a minha convicção que a força do tempo não vai corroer porque não é uma euforia, é uma obstinação.

Dedico este texto a todas as professoras e professores de todo o Brasil que vivenciam cotidianamente a profissão e sentem na pele as dificuldades do ofício, e mesclam a docência com o filantropismo, pois dinheiro nenhum paga esse trabalho.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Falando de Burocracia




Por André Andrade


 A Burocracia no imaginário brasileiro é algo pesadamente pejorativo. Todo processo que se resolve frente a uma instância pública levam o selo de “burocrático” por se mostrar um processo atravancado e que despende muito tempo para ser resolvido. A Burocracia conceituada a partir de um viés sociológico é mais que isso, e não é tão danosa assim se pensarmos como Weber, um dos primeiros sociólogos a estudar o assunto. Não querendo aqui dar nenhuma aula de sociologia, e nem se mostrar hermético (Ops, dificilmente compreensível, rsrs) o problema que quero expor é o seguinte: A Burocracia é necessária ou dispensável? Podemos pensar numa desburocratização, por exemplo da política? (e aí subentende-se que outras instituições também passam por  processos de burocratização, como a família). Antes disso, explicitemos em linhas gerais o que é Burocracia para que o problema fique melhor evidenciado.
Do francês Bureau, que quer dizer escritório, secretaria, ou num linguajar político, repartição pública, e daí juntando com “Kratos” temos o governo das repartições públicas. Então, de modo bem generalizado, podemos dizer que a burocracia é uma forma de organização que o Estado Moderno faz uso, onde encontra no funcionário público especializado em sua função e inserido numa hierarquia de cargos no qual estão interligados a partir de uma rede de subordinações entre gerentes e gerenciados. Estou explicando tomando como referência a Política, o qual a Burocracia se manifesta de forma mais perceptível por todos nós. Pretendo em um outro texto discutir a burocratização de nossas vidas, breve, espero.
Primeira pergunta: Por que essa forma de organizar-se? É uma forma racional de administração que possibilita “previsões”. C-O-M-O assim? A especialização das funções distribuídas e ramificadas em todo o sistema das repartições promove a rotinização dessas funções. Todas as ações são calculáveis, e, portanto, todos os serviços e demandas ficam passíveis de serem previstos. Desse modo, cria-se a estabilidade administrativa e organizacional que todo sistema político, institucional (o Estado, no caso), precisa para promover-se, perpetuar-se no poder, e até pra fins de estabilidade social, que necessariamente não significa que tudo está nos conformes, afinal, nem tudo são flores.
A razão do termo ser tratado como pejorativo pelo senso comum estão bem fundadas. Houve uma fragmentação demasiada do sistema burocrático. Ocorreu uma reprodução de subordinações tornando o sistema partido em divisões infinitesimais. Cada gerente tem seu gerente, e ninguém sabe quem é que comanda, quem dá o “apito final”. Com isso, o que era pra ser eficiente e auxiliador vem promovendo um atravancamento da máquina estatal. Para fins conceituais (e elucidativos), chamaremos de Burocracia aquilo que foi exposto no parágrafo anterior e de Burocratismo, a sua disfunção relatada (repetindo, de forma bem genérica) nesse parágrafo. Tudo isso para chegar ao clímax, ou, no pior de seu problema mais sintomático, a especialização das funções.
A especialização da mão-de-obra é o pior problema da Burocracia, ao meu ver. Funcionários que se especializam em suas funções e que por isso, se tornam donos de seus cargos, apropriando-se de espaços institucionais. Contarei uma historinha real pra ilustrar melhor. Visitei com a turma de Ciências Sociais da UESC a aldeia indígena Pataxó de Porto Seguro. Lá, ouvimos um probleminha relatado por um índio da tribo no que diz respeito à ausência de um Pajé na tribo. É que o último que detinha todo um conhecimento ancestral das plantas não imaginava que morreria tão cedo (o Pajé estava na “casa” dos setenta!!! Fato é que a média de vida dos índios pataxó ultrapassa os 80 anos, e olhe lá) e não se preocupou muito em já passar todo o seu saber ao seus dois iniciados (não é qualquer um que pode ser pajé, há toda uma trajetória mística e séria detectada logo na infância dos aspirantes ao cargo). Aconteceu que infelizmente o pajé faleceu e levou consigo todo o conhecimento milenar da medicina natural, o que deixou a tribo sem pajé. O caso é meramente ilustrativo, pois nesse caso, foi uma fatalidade, e no nosso caso,  é uma banalidade.
As pessoas apoderam-se dos cargos públicos, tomam pra si todo o conhecimento necessário para execução de suas funções, e de forma prepotente, tornam privado o que é público, não se preocupando em formar novos ocupantes dos cargos, criando assim impedimentos corriqueiros, resolvidos com algum suborno (esse “jeitinho” brasileiro...dá nos nervos!). Não direciono essa crítica aos cargos públicos conseguidos mediante concurso público, o que requer um conhecimento da legislação referente a assunto, além de um espaço maior pra ser debatida tal questão, já que a critica teria de ir de encontro às estruturas do sistema burocrático, ou seja, uma Tese!
Me referirei aos cargos políticos, que de 4 em 4 anos vencem, mas de 4 em 4 anos, vemos as mesmas figuras no comando. Suponho que o sucateamento da máquina estatal se dá pelo fato de políticos tornarem os cargos públicos cativos à sua personalidade. A questão é simples, quanto mais tempo ocupa-se num cargo político, mais o burocrata tende-se a acomodar-se, a não inovar-se, a corromper-se. Pra mim, político não é uma profissão, é um estado imputado a qualquer cidadão ou cidadã.
Esclarecer-me-ei falando dos franceses. Na Comuna de Paris, fato ocorrido no século XIX em que operários tomaram Paris e fundaram um Regime Socialista que não durou mais de 2 meses, houve uma coisa intrigante. Os “Comuna” instauraram um sistema circulatório no comando político, pois sabiam que as pessoas não podiam se acostumar no poder, deixar dominar-se pela Fortuna, como diria Maquiavel, em detrimento da Virtù. No Maio de 68, os estudantes lançavam ferrenhas críticas a burocracia “proletária” instaurada na URSS. O que era pra ser uma ditadura (o grupo revolucionário que se tomou o poder para passá-lo para os proletários) de transição de sistemas para o firmamento do Estado Comunista se transformou numa ditadura (o grupo tirânico que apoderou-se do poder sem alternância nos cargo). Nesse ínterim, os franceses faziam questão de criticar e não incorrer no erro exposto pela crítica, ou seja, em suas manifestações, não existia nenhum representante, nenhum líder, e os estudantes eram apáticos ao partido comunista francês, visto como seguidor do marasmo soviético. Tais críticas promovem o ressurgimento de idéias anarquistas que aliou-se às premissas do movimento Punk. Ressurge daí a velha discussão dos velhinhos senis (brincadeirinha) Marx e Proudhon: é ou não é necessário a Existência do Estado?
Bem, eu e minha mania de escrever demais, mas vou encerrar pontuando algumas questões que me afligem desde que comecei a pensar nisso tais como: por que a burocracia deu errado na URSS e deu tão “certo” no mundo capitalista? A Burocracia é a fonte da Corrupção? Existiria alguma alternativa ao sistema burocrático? Quiçá eu possa ampliar a discussão da temática aqui e falar, por exemplo, do plano do Ex-ministro da Fazenda Carlos Bresser de uma reforma gerencial. Não seria enfadonho fazer essa discussão aqui, já que  é um problema pertinente em nossa vida contemporânea.

domingo, 5 de dezembro de 2010

ANALFABETISMO ELEITORAL

Por Humberto Rodrigo


O brasileiro é taxado de não se envolver politicamente. O desdém a respeito da questão eleitoral perpassa pelo total alheamento ao cenário eleitoral do país, alheamento esse que vai desde o esquecimento dos candidatos em votou na última eleição até o completo desconhecimento das políticas públicas que têm sido tomadas (ou não) em prol da comunidade em que este está inserido. Neste cenário a própria cobrança aos governantes se torna fragilizada uma vez que não está embasada de nenhuma concretude, pois sem o conhecimento do que ocorre ao redor, não nem há como utilizar o jargão “’o prefeito’ não faz nada além de roubar”. Acusações à parte existem vários exemplos de comunidades que saíram, por conta própria, em busca de melhorias para o seu próprio meio. Exemplos desse tipo nos remete tanto à questões referentes a idéias tais como o “partido não-governamental” como, por outro lado, à questões a respeito da (falta) consciência eleitoral.
Dizem às tantas que brasileiro não é um povo engajado politicamente, que não tem consciência política. A esses eu digo-lhes que estão sendo míopes. O problema não é nem que não têm consciência política, o problema é que não têm uma EDUCAÇÃO POLÍTICA. A coisa é pior, usando de um ditado popular: “o buraco é mais embaixo”. Não ter consciência é achar que apenas os representantes do executivo é que precisam ser escolhidos cuidadosamente, enquanto que os representantes do legislativo são escolhidos porque um amigo indicou ou ainda pior: são escolhidos no caminho à secção de votação. E isso acontece não nego. Entretanto, não ter uma educação política é não acompanhar, sequer, a propaganda eleitoral; não acompanhar os debates televisivos. É fato que os EUA simplesmente PARAM em dias de debates na “telinha”. Chegamos ao cume de eleger um presidente por ele ser “bonito” [sic]. Isso é o ápice do analfabetismo eleitoral. A falta de educação política é tão mais grave que a falta de consciência, na medida em que a falta de consciência está inserida na falta de educação, afinal como se ter uma consciência daquilo que não se conhece?
A falta de uma educação política flerta com idéias antidemocráticas. O pressuposto passa por uma questão elementar: afinal qual o sentido de dar o direito de votar a quem não saber exercê-lo? Acaso você se submeteria a uma operação com um médico que não sabe fazer cirurgias? Ou confiaria o seu sonho de construir a casa própria a um pedreiro que não sabe construir casas? Se é bem verdade que hoje temos uma opinião pública suficientemente forte e desenvolvida, capaz de se opor veementemente a uma investida de cerceamento da democracia, também o é que o panorama de analfabetismo eleitoral favorecem aos maus políticos: Platão há milênios atrás já se preocupava com a possibilidade de que o político com a melhor retórica assumisse o poder, em detrimento daquele que tivesse as melhores propostas. O povo poderia facilmente ser enganado por aquele candidato que possuía uma boa oratória, afinal, as massas são movidas pela emoção ficando a razão em segundo plano. O temor de Platão tem se tornado realidade: quanto menos uma população se engaja politicamente, mais o político com melhor retórica assume em lugar daquele que tem melhores propostas.
Em resposta a essa falta de comprometimento com a política, idéias como a de Alexis de Tocqueville vem como uma proposta plausível: Tocqueville (em A Democracia na América) sugeriu a criação de pequenos grupos de ação (vide textos anteriores a respeito dos Partidos Não-Governamentais). Exemplos como a concepção de uma liga comunitária nos bairros (que seria responsável tanto pela mobilização de necessidades a priori – como mutirão de limpeza ou em prol de um vizinho que está necessitando de ajuda – quanto pela cobrança junto às autoridades competentes) surgem como modelos bastante acessíveis. Em sua viagem aos Estados Unidos (isso em meados do século XIX), Tocquecille ficara espantado com a capacidade de mobilização politica dos estado-unidenses. Esse tipo de mobilização é tão reflexo da educação eleitoral como sua causa. Sim, porque a partir do momento que em se está lidando com a política diretamente, a tendência natural é o maior envolvimento. O analfabetismo, ao contrário, cria o ambiente ideal para a proliferação de políticas/políticos desastrosos e danosos para a sociedade. Tocqueville ficou a abismado com a capacidade de organização e a consciência política dos estado-unidenses. Eu também fiquei.